segunda-feira, 11 de outubro de 2010

curtinhas

Filosofia - quem precisa disso? - Ayn Rand

Filosofia - quem precisa disso?
(Este é o texto de um discurso feito pela escritora Ayn Rand para os formandos da escola militar de West Point em 1974. Neste discurso ela reflete sobre a necessidade de se ter uma visão integrada do mundo, e sobre como a filosofia permite obter tal visão.)

Já que sou uma escritora de ficção, vamos começar com uma pequena história. Imagine que você é um astronauta cuja espaçonave perde o controle e cai em um planeta desconhecido. Quando você recobra a consciência e descobre que não está gravemente ferido, as primeiras três perguntas em sua mente seriam: Onde estou? Como descobrir? O que devo fazer?

Você vê uma vegetação não familiar do lado de fora, e há ar para respirar; a luz do sol parece mais pálida do que você se lembra, e mais fria. Você se vira para ver o céu, mas pára. Você é acometido por um sentimento súbito: se você não olhar, não vai ter que saber que está, talvez, distante demais da Terra e que é impossivel retornar; então enquanto você não olhar, é livre para acreditar no que quiser – e você sente um enevoado, agradável, mas algo culpado, tipo de esperança.

Você se volta para seus instrumentos: eles podem estar danificados, você não sabe o quanto seriamente. Mas você pára, acometido por um medo súbito: como você pode confiar nesses instrumentos? Como ter certeza de que eles não vão enganá-lo? Como você pode saber se eles vão funcionar em um mundo diferente? Você se afasta dos instrumentos.

Agora você se pergunta por quê não tem vontade de fazer nada. Parece muito mais seguro apenas esperar para algo, de alguma forma, aparecer; é melhor, você diz para si mesmo, não balançar a espaçonave. Ao longe na distância, você vê uma espécie de criaturas vivas se aproximando; você não sabe se são humanos, mas eles andam em dois pés. Eles, você decide, vão lhe dizer o que fazer.

Ninguém nunca mais tem notícias suas.

Isso é fantasia, você diz? Você não agiria dessa forma e nenhum astronauta jamais o faria? Talvez não. Mas essa é a maneira na qual a maioria dos homens vive suas vidas, aqui, na Terra.

A maioria das pessoas passa os dias lutando para evadir três questões, cujas repostas sublinham cada pensamento, sentimento e ação, estejam elas consciente disso ou não: Onde estou? Como eu sei isso? O que devo fazer?

Quando estão velhas o suficiente para entender essas perguntas, as pessoas acreditam que sabem as respostas. Onde estou? Digamos, em Nova York. Como eu sei? É auto-evidente. O que eu devo fazer? Aqui, elas não têm tanta certeza – mas a resposta padrão é: o que quer que todo mundo esteja fazendo. O único problema aparente é que eles não são muito ativos, não muito confiantes, não muito felizes – e sentem, de vez em quando, um medo sem razão e uma culpa indefinida, dos quais não conseguem se livrar.

Eles nunca descobriram o fato de que o problema vem das três perguntas não respondidas – e que existe uma única ciência capaz de respondê-las: a filosofia.

A filosofia estuda a natureza fundamental da existência, do homem, e da relação do homem com a existência. Ao contrário das ciências especiais, que lidam apenas com aspectos particulares, a filosofia lida com os aspectos do universo que dizem respeito à tudo que existe. No reino da percepção, as ciências especiais são as árvores, mas a filosofia é o solo fértil que torna a floresta possível.

A filosofia não diria a você, por exemplo, se você está em Nova York ou em Zanzibar (embora ela lhe desse os meios para descobrir). Mas aqui está o que ela iria lhe dizer: Você está em um universo que é regido por leis naturais e, consequentemente, é estável, firme, absoluto – e conhecível? Ou você está em um caos incompreensível, um reino de milagres inexplicáveis, um fluxo incompreensível e imprevisível, o qual a sua mente é incapaz de captar? As coisas que você vê ao seu redor são reais – ou são apenas uma ilusão? Elas existem independente de um observador – ou são criadas pelo observador? Elas são o sujeito ou o objeto da consciência do homem? Elas são o que são – ou podem ser modificadas por um simples ato da sua consciência, como um desejo?

A natureza das suas ações – e de sua ambição – será diferente, de acordo com o conjunto de respostas que você vir a aceitar. Tais respostas são da província da metafísica – o estudo da existência como tal ou, nas palavras de Aristóteles, do “ser como ser” – o ramo básico da filosofia.

Não importa a quais conclusões você chegue, você será confrontado pela necessidade de responder outra pergunta, corolária: Como eu sei? Como o homem não é onisciente ou infalível, você precisa descobrir o que pode chamar de conhecimento e como provar a validade das suas conclusões. O homem adquire conhecimento através de um processo da razão – ou através de uma revelação súbita de um poder sobrenatural? A razão é uma faculdade que identifica e integra o material provido pelos sentidos – ou é alimentada por idéias inatas, implantadas na mente das pessoas antes delas nascerem? A razão é competente para perceber a realidade – ou o homem possui alguma outra faculdade cognitiva superior à razão? O homem pode alcançar a certeza – ou está condenado à dúvida perpétua?

A extensão da sua auto-confiança – e do seu sucesso – será diferente, de acordo com o conjunto de respostas que você aceitar. Essas respostas são a província da epistemologia, a teoria do conhecimento, que estuda os meios de cognição do homem.

Estes dois ramos são a fundação teórica da filosofia. O terceiro ramo – ética – pode ser considerado a sua tecnologia. A ética não se aplica a tudo que existe, apenas às pessoas, mas ela se aplica a todos os aspectos de suas vidas: seu caráter, suas ações, seus valores, sua relação com o todo da existência. Ética, ou moralidade, define um código de valores para guiar as escolhas e ações das pessoas – as escolhas e ações que determinam o curso de sua vida.

Assim como o astronauta da minha história não sabia o que deveria fazer, porque se recusou a saber onde estava e como descobri-lo, você não pode saber o que deve fazer antes de conhecer a natureza do universo com o qual tem que lidar, a natureza dos seus meios de cognição – e sua própria natureza. Antes de você chegar à ética, você precisa responder as perguntas colocadas pela metafísica e pela epistemologia: o homem é um ser racional, capaz de lidar com a realidade – ou ele é um desajustado cego, irrecuperável, uma migalha carregada pelo fluxo universal? A conquista e o prazer são possíveis para o homem na terra – ou ele está condenado à derrota e à aversão? Dependendo das respostas, você pode proceder à consideração das perguntas colocadas pela ética: o que é bom ou mal para o homem – e por quê? A preocupação primária do homem deve ser uma busca pela felicidade – ou uma fuga do sofrimento? O homem deve considerar a sua auto-satisfação – ou sua auto-destruição – o objetivo de sua vida? O homem deve perseguir seus valores – ou deve colocar os interesses dos outros antes dos seus próprios? O homem deve aspirar à felicidade – ou ao auto-sacrifício?

Eu não preciso mostrar as diferentes consequências destes dois conjuntos de respostas. Vocês podem vê-las em todos os lugares – dentro de você e ao seu redor.

As respostas dadas pela ética determinam como as pessoas devem tratar outras pessoas, e isso determina o quarto ramo da filosofia: a política, que define os princípios de um sistema social propriamente dito. Como um exemplo do papel da filosofia, a filosofia política não irá lhe dizer quanta gasolina racionada você deve receber e em qual dia da semana – ela irá lhe dizer se o governo tem ou não o direito de impor o racionamento do que quer que seja.

O quinto e último ramo da filosofia é a estética, o estudo da arte, que é baseado na metafísica, na epistemologia e na ética. A arte lida com as necessidades – o reabastecimento – da consciência do homem.

Agora alguns de vocês podem dizer, como várias pessoas fazem: “Ah, eu nunca penso em termos tão abstratos – eu quero lidar com problemas concretos, particulares, da vida real – para quê eu preciso de filosofia?” Minha resposta é: para poder ter a capacidade de lidar com problemas concretos, particulares, da vida real – isto é, para ter a capacidade de viver na terra.

Você pode alegar – como a maioria das pessoas faz – que você nunca foi influenciado pela filosofia. Eu vou pedir para você verificar essa alegação. Você alguma vez já pensou ou disse o seguinte? “Não tenha tanta certeza – ninguém pode ter certeza de nada.” Essa noção veio de David Hume (e muitos, muitos outros), muito embora você talvez não tenha nunca ouvido falar nele. Ou: “Isso pode ser bom na teoria, mas não funciona na prática.” Isso veio de Platão. Ou: “Isso foi uma coisa terrível de ser feita, mas foi apenas humano, ninguém é perfeito nesse mundo.” Isso veio de Santo Agostinho. Ou: “Pode ser verdade para você, mas não é verdade para mim.” Isso veio de William James. Ou: “Eu não pude me controlar! Ninguém pode controlar nada do que faz.” Isso veio de Hegel. Ou: “Eu não posso provar, mas eu sinto que é verdade.” Isso veio de Kant. Ou: “É logico, mas lógica não tem nada a ver com a realidade.” Isso veio de Kant. Ou: “É mal, porque é egoísta.” Isso veio de Kant. Você já ouviu os ativistas modernos falando: “Aja primeiro, e pense depois?” Isso veio de John Dewey.

Algumas pessoas podem responder: “Claro, eu disse essas coisas em momentos diferentes, mas eu não tenho que acreditar em todas essas coisas o tempo todo. Pode ter sido verdade ontem, mas não é verdade hoje.” Isso veio de Hegel. Eles podem dizer: “A consistência é o duende das mentes pequenas.” Isso veio de uma mente muito pequena, Emerson. Eles podem dizer: “Mas alguém não pode transigir e pegar emprestado idéias diferentes de filosofias diferentes de acordo com as necessidades do momento?” Isso veio de Richard Nixon – que recebeu de William James.

Agora pergunte a si mesmo: se você não tem interesse em idéias abstratas, por que você (e todo mundo) se sente compelido à usá-las? O fato é que idéias abstratas são integrações conceituais que resumem um número incalculável de concretos – e que sem idéias abstratas você não seria capaz de lidar com problemas concretos, particulares, da vida real. Você estaria na posição de uma criança recém-nascida, para quem cada objeto é um fenômeno único e sem precedentes. A diferença entre o estado mental dela e o seu está no número de integrações conceituais que a sua mente realizou.

Você não tem escolha sobre a necessidade de integrar suas observações, suas experiências, seu conhecimento em idéias abstratas, isto é, em princípios. Sua única escolha é se esses princípios são verdadeiros ou falsos, se eles representam sua convicção consciente, racional – ou uma mistura de noções colhidas ao acaso, cujas fontes, validade, contexto e consequências você não conhece, noções que, com mais frequência do que não, você largaria como uma batata quente se soubesse.

Mas os princípios que você aceita (consciente ou inconscientemente) podem bater de frente ou contradizer um ao outro; eles, também, precisam ser integrados. O que os integra? A filosofia. Um sistema filosófico é uma visão integrada da existência. Como um ser humano, você não tem escolha sobre o fato de precisar de uma filosofia. Sua única escolha é se você define sua filosofia através de um processo de pensamento consciente, racional e disciplinado e de deliberação escrupulosamente racional – ou deixa o seu subconsciente acumular um monte de lixo de conclusões desmerecidas, generalizações falsas, contradições indefinidas, slogans indigestos, desejos não identificados, dúvidas e medos, reunídos pelo acaso, mas integrados pelo seu subconsciente em um tipo de filosofia vira-lata e fundidos em um único, sólido peso: a insegurança, como uma bola e corrente no lugar onde sua mente deveria ter criado asas.

Você pode dizer, como muitas pessoas o fazem, que não é fácil agir sempre com base em princípios abstratos. Não, não é fácil. Mas o quanto mais difícil é ter que agir com base neles sem nem saber o que são?

O seu subconsciente é como um computador – um computador mais complexo do que o homem pode construir – e sua principal função é a integração de suas idéias. Quem o programa? A sua mente consciente. Se você não o faz, se não alcança nenhuma convicção firme, o seu subconsciente será programado pelo acaso – e você irá se entregar ao poder de idéias que você não sabe que aceitou. Mas de um jeito ou de outro, o seu computador lhe dá relatórios, diários e horários, na forma de emoções – que são estimativas instantâneas das coisas ao seu redor, calculadas de acordo com os seus valores. Se você programou o seu computador através do pensamento consciente, você conhece a natureza dos seus valores e emoções. Se você não o fez, não sabe.

Muitas pessoas, particularmente hoje em dia, alegam que o homem não pode viver apenas de lógica, que existe o elemento emocional a ser considerado, e que eles confiam na orientação de suas emoções. Bem, assim agiu o astronauta da minha história. O erro é dele – e deles: os valores e emoções das pessoas são determinados pela sua visão fundamental da vida. O programador definitivo do seu subconsciente é a filosofia – a ciência a qual, de acordo com os emocionalistas, é impotente para afetar ou penetrar os mistérios pantanosos de suas emoções.

A qualidade do output de um computador é determinada pela qualidade do seu input. Se o seu subconsciente é programado pelo acaso, o seu output terá um caráter parecido. Vocês provavelmente já ouviram o eloqüente termo “gigo,” utilizado pelos operadores de computadores – que significa: “Garbage in, garbage out.” [“Entra lixo, sai lixo.”] A mesma fórmula se aplica ao relacionamento entre o pensamento e as emoções de uma pessoa.

Uma pessoa que é controlada pelas emoções é como uma pessoa que é controlada por um computador cujos relatórios ele não consegue ler. Ela não sabe se sua programação é verdadeira ou falsa, certa ou errada, se a levará ao sucesso ou à destruição, se ela serve aos seus propósitos ou aos propósitos de um poder desconhecido e maligno. Ela está cega em dois fronts: cega ao mundo ao seu redor e ao seu próprio mundo interior, incapaz de compreender a realidade ou seus próprios motivos, e cronicamente apavorada por ambos. Emoções não são ferramentas de cognição. As pessoas que não se interessam por filosofia precisam dela mais urgentemente: elas são as mais indefesas ao seu poder.

As pessoas que não se interessam por filosofia absorvem os seus princípios da atmosfera cultural ao seu redor – das escolas, faculdades, livros, revistas, jornais, filmes, televisão etc. Quem “dá o tom” de uma cultura? Um pequeno punhado de pessoas: os filósofos. Outros seguem sua liderança, seja por convicção ou por conveniência. Por cerca de duzentos anos, sob a influência de Immanuel Kant, a tendência dominante da filosofia tem sido dirigida para um único propósito: a destruição da mente do homem, de sua confiança no poder da razão. Hoje, nós estamos vendo o clímax dessa tendência.

Quando as pessoas abandonam a razão, elas descobrem não apenas que suas emoções não podem guiá-las, mas também que elas não conseguem experimentar nenhuma emoção que não o terror. A disseminação do vício em drogas entre os jovens criados nas modas intelectuais atuais demonstra o estado interno insuportável daqueles que foram desprivados dos seus meios de cognição e que desejam escapar da realidade – do terror da sua impotência em lidar com a existência. Observem o pavor de independência desses jovens e seu desejo desesperado de “fazer parte,” de se ligar a algum grupo, turma ou gangue. A maioria deles nunca ouviu falar de filosofia, mas eles sentem que precisam de algumas respostas fundamentais para perguntas que não têm coragem de fazer – e eles esperam que a tribo lhes diga como viver. Eles estão prontos para ser capturados por qualquer pajé, guru ou ditador. Uma das coisas mais perigosas que um homem pode fazer é submeter a sua autonomia moral aos outros: como o astronauta da minha história, ele não sabe se são humanos, embora andem sobre dois pés.

Agora você pode perguntar: se a filosofia pode ser tão maligna, por que alguém deveria estudá-la? Particularmente, por que alguém deveria estudar as teorias filosóficas que são obviamente falsas, não fazem nenhum sentido, e não apresentam qualquer ligação com a vida real?

A minha resposta é: em auto-proteção – e na defesa da verdade, justiça, liberdade e qualquer valor que você tenha ou venha a ter algum dia.

Nem todas as filosofias são malignas, embora muitas delas o sejam, particularmente na história moderna. Por outro lado, na raiz de todo conquista civilizada, como a ciência, tecnologia, progresso, liberdade – na raiz de todos os valores que aproveitamos hoje, incluindo o nascimento deste país – vocês irão encontrar a conquista de um homem, que viveu há mais de dois mil anos atrás: Aristóteles.

Se vocês não sentem nada além de tédio quando lêem as teorias virtualmente ininteligíveis de alguns filósofos, vocês contam com a minha mais profunda simpatia. Mas se vocês as colocam de lado, dizendo: “Por que eu devo estudar esse negócio quando eu sei que é besteira?” – vocês estão enganados. É besteira, mas você não sabe – não enquanto você continua aceitando todas as suas conclusões, todos os malignos bordões gerados por esses filósofos. E não enquanto vocês forem incapazes de refutá-los.

Aquela besteira lida com o mais crucial, as questões de vida ou morte da existência do homem. Na raiz de toda teoria filosófica de significância, existe uma questão legítima – no sentido de que existe uma necessidade autêntica da consciência humana, que algumas teorias se esforçam para clarificar e outras para obscurecer, corromper e impedir o homem de algum dia descobrir. A batalha dos filósofos é uma batalha pela mente do homem. Se você não entende suas teorias, se torna vulnerável aos piores dentre eles.

A melhor maneira de estudar filosofia é abordá-la como se aborda uma história de detetive: siga cada trilha, pista e implicação, para descobrir quem é um assassino e quem é um herói. O critério de detecção são duas perguntas: Por quê? E como? Se uma dada afirmação parece ser verdadeira – por quê? Se outra parece ser falsa – por quê? E como ela está sendo apresentada? Você não vai encontrar todas as respostas imediatamente, mas vai adquirir uma característica que não tem preço: a habilidade de pensar em termos essenciais.

Nada é dado ao homem automaticamente, nem conhecimento, nem auto-confiança, nem paz interior, nem a maneira correta de utilizar sua mente. Cada valor que ele necessita ou deseja tem que ser descoberto, aprendido e adquirido – até a postura correta do seu próprio corpo. Neste contexto, eu quero dizer que sempre admirei a postura dos cadetes de West Point, uma postura que projeta o homem em um controle orgulhoso e disciplinado do seu corpo. Bem, o treinamento filosófico dá ao homem a postura intelectual correta – um controle orgulhoso e disciplinado da sua mente.

Na sua profissão, na ciência militar, vocês sabem da importância de acompanhar as armas, estratégias e táticas do inimigo – e de se estar preparado para enfrentá-las. O mesmo é verdade na filosofia: você precisa entender as idéias do inimigo e estar preparado para refutá-las, você precisa conhecer seus argumentos básicos e ser capaz de explodi-los.

Na guerra física, você não mandaria os seus homens para uma armadilha: você faria todos os esforços para descobrir a sua localização. Bem, o sistema de Kant é a maior e mais intricada armadilha na história da filosofia – mas é tão cheia de furos que uma vez que você entenda o seu truque, você consegue desmontá-la sem qualquer problema e andar sobre ela em perfeita segurança. E, uma vez desmontada, os Kantianos menores – as patentes menores do seu exército, os sargentos, cabos e mercenários filosóficos de hoje em dia – irão cair sozinhos pela própria falta de peso, numa reação em cadeia.

Existe uma razão especial pela qual vocês, os futuros líderes do Exército dos Estados Unidos, precisam estar armados filosoficamente nos dias de hoje. Vocês são o alvo de um ataque especial do estabelecimento Kantiano-Hegeliano-coletivista que domina nossas instituições culturais no presente. Vocês são o exército do último país semi-livre da terra, e no entanto são acusados de ser uma ferramenta do imperialismo – e “imperialismo” é o nome dado à política externa deste país, que nunca se envolveu em conquistas militares e nunca lucrou com as duas guerras mundiais, que ele não começou, mas nas quais entrou e venceu. (Foi, incidentemente, uma política tola e excessivamente generosa que fez este país gastar sua riqueza ajudando tanto seus aliados como ex-inimigos.) Algo chamado de “complexo militar-industrial” – que é um mito ou algo pior – está sendo culpado por todos os problemas deste país. Marginais universitários gritam exigências de que unidades ROTC [similares ao CPOR, no Brasil] sejam banidas dos campus. Nosso orçamento de defesa está sendo atacado, denunciado e reduzido por pessoas que alegam que a prioridade financeira deve ser dada a jardins ecológicos de rosas e a aulas de auto-expressão estética para os moradores das favelas.

Alguns de vocês podem estar confusos com essa campanha e podem estar se perguntando, de boa fé, que erros vocês cometeram para trazê-la à tona. Se este for o caso, é urgentemente importante para você entender a natureza do inimigo. Você é atacado, não por algum erro ou falha, mas por suas virtudes. Você é denunciado, não por alguma fraqueza, mas pela sua força e sua competência. Vocês são penalizados por serem os protetores dos Estados Unidos. Em um nível menor da mesma questão, uma campanha parecida é conduzida contra a força policial. Aqueles que desejam destruir este país, procuram desarmá-lo – intelectualmente e fisicamente. Mas não é apenas uma questão política; a política não é a causa, mas a última consequência das idéias filosóficas. Não é uma conspiração comunista, embora alguns comunistas possam estar envolvidos – como vermes lucrando com um desastre que não tiveram o poder de originar. O motivo dos destruidores não é amor pelo comunismo, mas ódio da América. Por quê ódio? Porque a América é a refutação viva de um universo Kantiano.

A preocupação sentimentalista e a compaixão para com os fracos, os falhos, os sofredores, os culpados, é uma cobertura para o ódio profundamente Kantiano do inocente, do forte, do apto, do vitorioso, do virtuoso, do confiante, do feliz. Uma filosofia para destruir a mente do homem é necessariamente uma filosofia de ódio ao homem, à vida humana, e a todos os valores humanos. Ódio do bom por ser bom, é a marca do século XX. Esse é o inimigo que vocês estão enfrentando.

Uma batalha deste tipo requer armas especiais. Ela deve ser lutada com um completo entendimento da sua causa, uma completa confiança em você mesmo, e a mais completa certeza moral de ambos. Somente a filosofia pode provê-los com essas armas.

O objetivo que dei a mim mesma esta noite não é convencê-los da minha filosofia, mas da filosofia como tal. Eu estive, no entanto, falando implicitamente sobre a minha filosofia em cada frase – já que nenhum de nós e nenhuma afirmação pode escapar das premissas filosóficas. Qual o meu interesse egoísta nesse assunto? Eu tenho a confiança suficiente para acreditar que se você aceitar a importância da filosofia e a tarefa de examiná-la criticamente, é a minha filosofia que você virá a aceitar. Formalmente, eu a chamo de Objetivismo, mas informalmente eu a chamo de uma filosofia para viver na terra. Vocês irão encontrar uma apresentação explícita em meus livros, particularmente em Atlas Shrugged.

Em conclusão, permitam-me falar em termos pessoais. Esta noite significa muito para mim. Eu me sinto profundamente honrada pela oportunidade de falar para vocês. Eu posso dizer – não como uma leviandade patriótica, mas com o completo conhecimento das raízes metafísicas, epistemológicas, éticas, políticas e estéticas necessárias – que os Estados Unidos da América são o mais nobre e, em seus princípios fundadores originais, o único país moral na história do mundo. Existe uma espécie de radiância calma associada em minha mente com o nome West Point – porque vocês têm preservado o espírito desses princípios fundadores originais e vocês são o seu símbolo. Houve contradições e omissões nesses princípios, e talvez existam nos seus – mas eu estou falando dos essenciais. Talvez existam indivíduos na sua história que não viveram à altura dos ideais mais altos – como existem em qualquer instituição – já que nenhuma instituição e nenhum sistema social pode garantir a perfeição automática de todos os seus membros; isso depende da livre vontade de um indivíduo. Eu estou falando dos seus padrões. Vocês têm preservado três qualidades de caráter que eram típicas na época do nascimento da América, mas são virtualmente inexistentes nos dias de hoje: convicção – dedicação – um sentido de honra. Honra é a auto-estima tornada visível em ação.

Vocês escolheram arriscar suas vidas pela defesa deste país. Eu não vou insultá-los dizendo que são dedicados ao serviço por altruísmo – isso não é uma virtude na minha moralidade. Na minha moralidade, a defesa do seu país significa que um homem é pessoalmente incapaz de aceitar viver como o escravo conquistado de qualquer inimigo, estrangeiro ou doméstico. Essa é uma enorme virtude. Alguns de vocês talvez não tenham consciência disso. Eu quero ajudá-los a perceber.

O exército de um país livre tem uma grande responsabilidade: o direito de usar a força, mas não como instrumento de compulsão e conquista bruta – como os exércitos de outros países fizeram em suas histórias – apenas como um instrumento de auto-defesa de um país livre, o que significa: em defesa dos direitos individuais do homem. O princípio de utilizar a força apenas em retaliação contra aqueles que iniciam seu uso é o princípio da subordinação do poder ao direito. A mais alta integridade e sentido de honra são necessários para tal tarefa. Nenhum outro exército no mundo a conseguiu. Vocês conseguiram.

West Point tem dado à América uma longa linha de heróis, conhecidos e desconhecidos. Vocês, os formandos deste ano, têm uma gloriosa tradição a manter – a qual eu admiro profundamente, não porque é uma tradição, mas porque é gloriosa.

Já que eu venho de um país culpado pela pior tirania na terra, eu sou particularmente capaz de apreciar o significado, a grandeza e o supremo valor daquilo que vocês estão defendendo. Então, em meu próprio nome e em nome das várias pessoas que pensam como eu, eu quero dizer, a todos os homens de West Point, do passado, presente e futuro: obrigado.

domingo, 10 de outubro de 2010

Ayn Rand [5/5] entrevistada por Phil Donahue

Ayn Rand [4/5] entrevistada por Phil Donahue

Ayn Rand [3/5] entrevistada por Phil Donahue

Ayn Rand [2/5] entrevistada por Phil Donahue

Ayn Rand [1/5] entrevistada por Phil Donahue

Entrevista histórica - Ayn Rand - parte III

Entrevista histórica - Ayn Rand - parte II

Entrevista histórica - Parte I

Objetivismo

Objetivismo é a filosofia identificada pela autora e filósofa Russa-Americana Ayn Rand. O Objetivismo afirma que a realidade existe independente da consciência, que o homem tem contato direito com a realidade através dos seus sentidos, que ele pode ter conhecimento objetivo através do processo de formação de conceitos, da lógica dedutiva e indutiva, que o objetivo moral da vida do homem é atingir sua própria felicidade ou interesse racional, que o único sistema social consistente com esta moralidade é um que respeite os direitos do homem à sua vida, liberdade, propriedade e busca à felicidade, ou seja, capitalismo laissez-faire, e que a função da arte na vida do homem é transformar suas idéias metafísicas mais abstratas, reproduzindo seletivamente a realidade, em forma física.
Rand originalmente expressou suas idéias filosóficas em seus romances Quem é John Galt?, A Nascente (ver discurso no post anterior) e livros de não-ficção como Capitalismo: O Ideal Desconhecido, A Virtude do Egoísmo, entre outros.
O nome Objetivismo vem do princípio que o conhecimento e valores humanos são objetivos: eles não são criados pelos pensamentos que alguém tem, mas determinados para natureza da realidade, para serem descobertos pelo homem. Rand disse que ela escolheu este nome porque o seu termo preferido para uma filosofia baseado na primazia da existência - existencialismo - já havia sido usado.

Os próximos posts, apresentarão um pouco das idéias desta genial filosofa

O melhor discurso jamais feito em favor do indivíduo

Você acredita que a bíblia seja verdadeira?

fatos e evidências

Um maravilhoso milagre para louvor do senhor

argumentos infalíveis provam o criacionísmo

Ateus iludidos

Deus apenas parece não existir

E se deus desaparecesse (ótima)

Historicidade de Jesus

terça-feira, 24 de agosto de 2010

A ciência pode responder questões morais?

Entrevista Daniel Dennett







Para filósofo americano, em algumas áreas dos EUA os ateus ainda sofrem a mesma discriminação que os homossexuais sofriam na década de 1950.

Quando dezembro chega, diversão é o que não falta na vida do filósofo americano Daniel Dennett, 68. Além de ser tomado por Papai Noel pelas crianças mais empolgadas, o pesquisador ainda organiza sessões caseiras de música natalina.

Só não o convide para a Missa do Galo: ele é um dos mais articulados defensores do ateísmo de inspiração científica.




“É uma espécie de confusão na cabeça deles”

Autor de “A Perigosa Ideia de Darwin” e “Quebrando o Encanto”, Dennett se especializou em explicar com clareza os conceitos-chave da teoria da evolução, usando-a para abordar temas como a natureza da consciência e as origens da religião. Ele afirma que tentar conciliar os dados da biologia evolutiva com a crença em Deus é um ato de desespero intelectual. Os que fazem isso, ataca, “estão apresentando como ciência o que, na verdade, é uma espécie de confusão na cabeça deles”.

Diz também que se declarar ateu hoje em algumas regiões dos EUA é o equivalente a se declarar homossexual nos anos 1950, e que a onda recente de livros escritos por cientistas ateus militantes está ajudando a tirar o ateísmo do armário. Dennett, que estará no Brasil no dia 8 de novembro para participar do seminário Fronteiras do Pensamento, em Porto Alegre, conversou com a Folha por telefone. Leia abaixo a entrevista.



FOLHA – Há um grupo de cientistas nos EUA, como Francis Collins, ex-chefe do Projeto Genoma Humano, que são defensores da teoria da evolução e, ao mesmo tempo, tentam conciliá-la com sua fé cristã. Mas têm sido muito atacados, até acusados de criacionistas disfarçados. O sr. concorda com tais críticas?

DANIEL DENNETT – Acho que essas pessoas têm dois padrões diferentes para o que consideram pensamento racional. Quando estão fazendo ciência, adotam um padrão elevadíssimo e, quando estão tentando reconciliar sua ciência com sua religião, acabam aceitando que esse padrão caia um pouco, tolerando argumentos que nunca tolerariam numa discussão científica. Não acho que sejam criacionistas, mas acho que eles estão apresentando como ciência o que, na verdade, é uma espécie de confusão na cabeça deles.



“O Superman pousou aqui durante a Explosão Cambriana”

FOLHA – Mas eles deixam claro que a reconciliação não é ciência nem está cientificamente comprovada. 


DENNETT - E até que é uma boa tentativa, mas não acho que funcione bem. Podemos colocar da seguinte maneira: a biologia, a teoria evolutiva, não prova de forma absoluta que não pode existir um Deus. Se você quer continuar a acreditar que Ele desempenha algum papel, pode até fazer isso com sua consciência tranquila. Mas você deveria ter em mente que se trata de uma posição que é quase um ato de desespero, não é uma visão positiva de maneira alguma. É uma espécie de último recurso. Terminei recentemente um livrinho que deve ser lançado em breve, um debate com o filósofo cristão Alvin Plantinga. E Plantinga argumenta, corretamente, que a teoria evolutiva é logicamente compatível com a crença num Criador que intervém no processo evolutivo. 
Admiti que isso era verdade, mas disse que a evolução também é compatível com a hipótese de que o Superman pousou aqui durante a Explosão Cambriana [evento em que surgiram todos os principais grupos de animais], há 530 milhões de anos e, assim, possibilitou a origem dos humanos. É uma hipótese totalmente doida, mas é coerente com tudo o que sabemos sobre biologia evolutiva.



FOLHA – A onda recente de livros escritos por cientistas que também são ateus militantes surgiu, de acordo com os próprios autores, porque a posição acomodacionista em relação à religião não estava funcionando. E essa nova abordagem? O sr. acha que está funcionando? 


DENNETT – Acho que sim, por enquanto, embora estejamos só no começo. Nos EUA, acho que houve uma mudança clara nos padrões de expressão pública. Hoje é muito mais comum ouvir as pessoas dizerem abertamente que não acreditam em Deus, que elas são “sem-deus”. Pesquisas recentes mostram que esse é o grupo que mais cresce na população. E, toda vez que alguém se declara abertamente, que se sente encorajado a dizer isso, a atmosfera fica um pouco mais limpa, e a vida fica um pouco mais fácil para outras pessoas. 
Ainda há enormes áreas do país onde, se você disser que não acredita em Deus, vai perder seus amigos, seu negócio. Nesse ponto, os ateus estão mais ou menos na mesma posição em que estavam os homossexuais nos anos 1950, ou seja, se você admitir que pertence a esse grupo, sua vida está arruinada. 
Temos de mudar isso. Temos de fazer com que seja possível para um morador do “Cinturão da Bíblia” [as áreas mais religiosas dos EUA, nos Estados do Sul e do Meio-Oeste] dizer com toda a franqueza: “Bem, você pode ter sua religião, se quiser, mas eu não sou religioso” e ser respeitado mesmo assim.



“A religião emerge como subproduto de predisposições psicológicas”

FOLHA - No livro “Quebrando o Encanto”, sobre a tentativa de explicar as origens da religião com base na biologia evolutiva, o sr. passa a impressão de defender mais a ideia de que a religião é só um subproduto de características da mente humana que evoluíram por outros motivos. Sua posição contra a religião pode ter influenciado essa opinião? 


DENNETT – Acho que é importante perceber que as duas visões não são necessariamente conflitantes. Há uma posição óbvia, natural, que diz que primeiro a religião emerge como subproduto de predisposições psicológicas que não têm nada a ver com a religião, e então, depois que ela passa a existir, acaba sendo aproveitada para outras funções, evoluindo, digamos, social e culturalmente. Desse jeito, você pode manter ambas as vertentes, e na verdade acho que esse modelo é bem mais plausível do que uma visão puramente ligada à adaptação, porque é muito difícil imaginar quais teriam sido as pressões de seleção [para que a religião surgisse].



FOLHA – O que o sr. acha da dificuldade das ciências humanas para incorporar a biologia evolutiva na sua maneira de pensar? 


DENNETT – Para mim é engraçado ver a quantidade de antidarwinistas “automáticos” existente nas humanidades, na filosofia. Foi o reconhecimento disso que me levou a escrever “A Perigosa Ideia de Darwin”. Hei de ir em frente com bom humor e vou mostrar a eles o quão reacionários estão sendo.



“Custaria mais do que pousar na Lua”

FOLHA - Mas por que a resistência? 


DENNETT – Acho que eles estão muito presos à ideia que poderíamos chamar de criatividade de cima para baixo, na qual você tem um autor que é o gênio, a fonte das ideias. Essa visão está impressa de modo tão fundo nas artes e nas humanidades que a ideia de que na verdade a coisa está de ponta-cabeça, que os próprios grandes gênios são o produto complexo de processos “sem mente”, algorítmicos, de baixo para cima -essa é uma ideia muito difícil de engolir para muita gente. A primeira coisa que nós temos de mudar é o hábito dos especialistas em ciências humanas de zombar dessas ideias e ridicularizá-las. A zombaria deles é obscurantista, ignorante.



FOLHA – Qual a sua visão sobre o estado atual da pesquisa em inteligência artificial? Por que ainda estamos tão longe de conseguir criar uma máquina consciente? 


DENNETT - Algumas pessoas que começaram a estudar a IA [inteligência artificial] não estavam interessadas em consciência, mas apenas em produzir alguns sistemas cognitivos extremamente competentes. Essa abordagem foi um sucesso. Não chamamos isso de IA, mas agora faz parte das nossas vidas, seja no caso do reconhecimento de voz, no planejamento de reservas de voo, no controle de diversos elementos dos nossos automóveis. Em certo sentido, tudo isso é inteligência artificial. Quando as pessoas pensavam em robôs 20 anos ou 30 anos atrás, imaginavam humanoides que seriam mordomos, arrumadeiras ou cozinheiros. 
Esses robôs não existem, mas ao menos parte dessas tarefas hoje são rotineiramente delegadas ao controle de computadores. Então, esse primeiro sonho se realizou, de fato. O outro sonho da IA, o de realmente construir um robô consciente, sempre foi loucamente ambicioso, e uma das coisas que aprendemos foi exatamente a dimensão dessa dificuldade. A robótica humanoide continua, mas acho que nunca criaremos um robô humanoide consciente. Custaria mais do que pousar na Lua.



“A criançada às vezes ainda me confunde com Papai Noel”

FOLHA – Em “A Perigosa Ideia de Darwin” o sr. diz que, ainda que não seja possível ou sensato rezar para o Universo, a ciência proporciona uma espécie de assombro transcendental diante dele. Nesse ponto, a ciência e a religião não se aproximam? 


DENNETT – Sim, eu acho que a melhor ideia da religião é encorajar uma certa modéstia, um respeito e uma reverência pela natureza neste incrível Universo que nós habitamos. E, claro, isso remonta diretamente a [Baruch] Spinoza [filósofo holandês do século 17], para quem o caminho para estudar Deus é estudar a natureza. Acho que o respeito e o amor por este mundo maravilhoso no qual existimos, que pode nos inspirar a melhorá-lo para outras pessoas, é a melhor mensagem da religião, e a ciência pode compartilhar esse sentimento.



FOLHA – O sr. ainda participa de corais de Natal? 


DENNETT – Sim, todos os anos fazemos uma festa dedicada a canções natalinas, temos nosso próprio livro de partituras que eu fui montando com todo o carinho ao longo dos anos. É lindo. Costumam aparecer umas 30 pessoas, talvez algumas delas sejam religiosas, mas a maioria deles é como eu. Somos cristãos culturais – crescemos com essas músicas e adoramos, então mantemos a tradição viva. E, sim, a criançada às vezes ainda me confunde com Papai Noel.

sábado, 3 de abril de 2010

Viés da confirmação

Raciocínios "motivados"
por Contardo Calligaris *
publicado em 24/2/2007.


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Qual deveria ser a função principal dos auxiliares de nossos representantes eleitos?
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É BANAL reconhecer que mesmo nossos pensamentos mais racionais são parasitados por afetos e emoções. Ou seja, uma boa parte de nossos raciocínios são, de fato, "wishful thinking", meditações motivadas pelo desejo.

Em 2002, aliás, um psicólogo, Daniel Kahneman, ganhou o Prêmio Nobel de Economia por trabalhos que mostram como os agentes econômicos (investidores, consumidores etc.) acreditam obedecer, em suas escolhas, a critérios racionais (utilidade, lucro, interesse), mas, de fato, são levados por emoções que eles desconhecem e que os impedem de calcular corretamente os riscos de seus atos.

Outros pesquisadores chegaram mil vezes a conclusões parecidas analisando pensamentos políticos, nos quais a racionalidade é seriamente ameaçada por afetos e emoções. Isso, claro, sem que o sujeito pensante se dê conta da interferência.

Recentemente, o "Journal of Cognitive Neuroscience" (revista de neurociência cognitiva, 18:11, 2006) publicou uma pesquisa, de Drew Westen e outros, que, pela primeira vez, comprova "materialmente" o peso das motivações afetivas e emocionais em nossos pensamentos.

Os sujeitos da amostra deviam julgar, por exemplo, uma explicação fornecida por um político. Enquanto decidiam se a explicação lhes parecia plausível ou não, seu funcionamento cerebral era monitorado por ressonância magnética.

Embora os sujeitos jurassem que eles estavam decidindo fria e racionalmente, suas escolhas implicavam uma intensa atividade de zonas cerebrais classicamente envolvidas na regulação afetiva, na defesa psicológica e no "viés de confirmação".

O "viés de confirmação" é um funcionamento psíquico freqüente (e catastrófico) no diagnóstico médico, no discurso político e nas brigas de casais. Ele consiste no seguinte: o sujeito procura ativa e seletivamente (embora de maneira inconsciente) dados que confirmem sua hipótese ou o seu preconceito iniciais. O prazer de ter razão prevalece sobre argumentos e informações, produzindo cegueiras.

Com a pesquisa de Westen, as neurociências afirmam algo que a psicologia (social e clínica) sabe há tempo: nosso raciocínio é influenciado por afetos implícitos que nos levam a "minimizar estados afetivos negativos e potencializar estados afetivos positivos". A gente pensa e escolhe não no interesse da verdade, mas para sentir-se bem. O próprio Westen reconhece sua dívida mais antiga: "Freud descobriu esses processos há décadas, usando o termo "defesa" para descrever os processos pelos quais as pessoas adaptam seus resultados cognitivos de maneira a evitar sentimentos desagradáveis como angústia e culpa".

O que fazer com isso? É possível desistir da verdade, considerando que o mundo é um vasto teatro em que as subjetividades se enfrentam e que o que importa é apenas a versão de quem ganha a luta (retórica ou armada).

Ou, então, talvez seja possível amparar a verdade, preservá-la de nossas próprias motivações. Podemos, por exemplo, desconfiar de nossas idéias, sobretudo quando nos sentimos particularmente satisfeitos com o entendimento da realidade que elas nos proporcionam. Pois a verdade (com o curso de ação que, eventualmente, ela "impõe") é geralmente pouco gratificante e de acesso trabalhoso.

Um exemplo. Nossos deputados não precisam ter uma competência específica: o essencial, em princípio, é que sejam dignos de nossa confiança. Imaginemos que sejam. O orçamento prevê que cada deputado disponha de 25 auxiliares.

Sem dúvida, os eleitos precisam de secretários, motoristas e mesmo de marqueteiros, mas, antes de mais nada, para poder legislar, eles precisam de dados e informações corretas. A arte de um legislador eficaz está na sua capacidade de apreender a realidade para tentar melhorá-la, não na qualidade retórica que é a praga habitual do discurso político (geralmente animado por vontade de seduzir e viés de confirmação).

Portanto, um deputado deveria dispor de pesquisadores qualificados (por exemplo, jovens mestres e doutores das áreas jurídica, socioeconômica e científica), capazes de encontrar rapidamente, sobre cada assunto debatido, a literatura essencial e de resumi-la, traduzi-la e apresentá-la de maneira que o representante vote conhecendo (de verdade) a questão em pauta.

Pergunta: quantos dos auxiliares de nossos representantes respondem a esse critério básico?

Verdade

sábado, 2 de janeiro de 2010

Curtinhas 14

"Cristianismo é a crença de que um judeu zumbi cósmico, que é pai de si mesmo, pode te dar vida eterna se você simbolicamente (ou não) comer sua carne, beber seu sangue e dizer telepaticamente à ele que o aceita como seu mestre; dessa forma ele pode retirar da sua alma uma força maligna que está presente em toda a humanidade por causa de uma mulher feita da costela de um homem que foi convencida por uma cobra falante a comer um fruto de uma árvore mágica proibida... "

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